Precisamos refletir sobre a importância do cabelo como uma construção de identidade

A importância do cabelo como uma construção de identidade

Vocês já repararam como as pessoas pretas estão cada vez mais assumindo com orgulho os seus cabelos crespos? Já refletiram que esse movimento é muito recente e que se voltássemos 10 anos no tempo a regra era raspar o cabelo dos meninos e alisar o cabelo das meninas desde muito cedo? Vamos refletir juntos sobre essas questões ao longo deste texto. 

Falar sobre estética negra enquanto componente presente na atualidade é algo inédito. Não que uma estética negra nunca tenha existido antes ou que a cultura negra em si não tenha encontrado formas de resistir à padronização europeia (e inalcançável). Ocorre que quando falamos em cabelos cacheados e principalmente os crespos, estamos nos referindo a estilos que foram considerados indesejados há muito tempo, não obstante meninas pretas tivessem os seus cabelos alisados com produtos químicos extremamente agressivos e garotos pretos fossem estimulados a rasparem sempre as suas cabeças desde muito cedo para que apresentassem um visual “apresentável”. 

Além disso, sempre tivemos toda uma indústria cosmética voltada exclusivamente a uma estética branca (para pele, cabelo, maquiagem etc). Tudo isso estando de acordo com uma lógica racista de que a existência preta seria feia, indesejada e que não merecia cuidados. 

Em contrapartida, como bem fazemos desde os tempos do nefasto processo de escravização, as pessoas pretas nunca deixaram de cultivar, dos mais variados modos, as suas raízes. A autora Nilma Lino Gomes discorre em seu livro intitulado “O Movimento negro Educador” sobre a pluralidade de conceituações possíveis a respeito do que seria a instituição “Movimento Negro” e, muito além de se limitar a uma conceituação específica, nos diz o seguinte: ”Importa-nos compreender a potência desse movimento social e destacar as dimensões mais reveladoras do seu caráter emancipatório, reivindicativo e afirmativo, que o caracterizam como um importante ator político e como um educador de pessoas, coletivos e instituições sociais ao longo da história e percorrendo as mais diversas gerações”. 

Silvio de Almeida abriu ainda mais esta definição ao afirmar em sua entrevista no programa Roda Viva que “movimento negro são pessoas negras em movimento” e isso engloba terreiros, escolas de samba, a solidariedade existente nas favelas compostas por maioria de pessoas pretas. Em suma, lugares de empoderamento e aprendizado acima de tudo.

Tudo isso pra chegar no ponto de que nesses espaços ocupados por pessoas negras, a estética também sempre foi um fator a ser considerado. Enquanto a sociedade utilizava de todo o seu aparato para nos dizer o quão longe estávamos do que poderia ser considerado belo, os blocos afro de Salvador como o Ilê Aiyê promovem, há mais de 40 anos, eventos como a noite da beleza negra, responsável pela escolha da Deusa do ébano anualmente. 

Além dos eventos de exaltação à beleza negra, cotidianamente, as pessoas começaram a assumir os seus cabelos crespos e cacheados, passar por transições capilares para abandonar os produtos químicos e as chapinhas, assumir blacks, dreads e tranças etc. Em Salvador, surgiu a marcha do empoderamento crespo, em 2015, com o intuito de incentivar cada vez mais pretas e pretos a exibirem os seus cabelos naturais. 

Mas agora queremos saber de você: Quais as suas impressões sobre esse movimento recente de empoderamento do cabelo crespo? O cabelo crespo pode ser também um instrumento político? Vamos continuar essa discussão nos comentários 🙂 

Como resultado de todo este movimento temos atualmente diversas marcas com linhas específicas para cabelos crespos, campanhas com pessoas pretas e todo um setor do mercado voltado a esse público que consome e não é pouco, mas para não me alongar nas reflexões, deixarei apenas uma máxima: NUNCA FOI REPRESENTATIVIDADE, SEMPRE FOI LIBERALISMO. 

Por fim, o cabelo crespo é e sempre foi um símbolo de resistência e de beleza que resistiu bravamente ainda que tenham tentado, com muito afinco, nos convencer do contrário. Sair de casa ostentando nossos blacks, tranças e penteados é também uma forma de ostentar o nosso orgulho e reverenciar os ancestrais que vieram antes de nós e abriram o caminho que hoje já trilhamos com um pouco mais de facilidade.

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