Nos últimos anos, muito tem se abordado a temática da apropriação cultural e o tanto que isso afeta os envolvidos cada vez que objetifica, simplifica e reduz simbologias históricas a meros adereços ou modismos. Entretanto, não é incomum encontrar quem ainda não conheça ou domine os conceitos relacionados a essa temática – e, isso não é um problema, pelo menos, para nós. Por esse motivo, lhes convido a construir uma experiência a partir da leitura para avançar na compreensão. Afinal, o que é apropriação cultural?
Para compreender o significado dessa expressão, é necessário analisar o que cada termo significa de forma individual. O termo cultura pode ser definido como sendo o conjunto de práticas, símbolos e valores que um grupo específico compartilha entre si. Por exemplo, as ocas são um símbolo importante para a cultura indígena, pois é parte essencial da constituição histórica do grupo da qual ela pertence. Apropriação, por sua vez, refere-se ao ato de tomar para si determinado elemento sem o consentimento do proprietário. E então? Agora ficou mais fácil? Apropriação Cultural basicamente, é a ação de adotar elementos de uma cultura da qual você não faz parte, estabelecendo uma relação de poder. Uma cultura, historicamente suprimida e menorizada, tem seus elementos roubados e seus sentidos apagados pela cultura que sempre a dominou.
Rodney William, doutor em Ciências Sociais, antropólogo e autor do livro “Apropriação Cultural”, define este conceito como uma uma estratégia de dominação que visa apagar a potência de grupos histórica e sistematicamente inferiorizados, esvaziando de significados todas as suas produções, como forma de promover seu genocídio simbólico. Portanto, a apropriação desses símbolos colabora para a manutenção do racismo estrutural em nossa sociedade e para a continuidade de diversos estereótipos sobre determinadas culturas.
Para muitas pessoas, afirmar-se pertencente à determinado grupo é uma tarefa dolorosa. Tomemos como exemplo a população negra no Brasil. Como consequência de 300 anos de um processo de escravização, enfrentam até hoje um sistema que reprime tudo que diz respeito à sua origem – seus traços, costumes, crenças, trajetórias. E, quando uma pessoa negra, inserida nessa realidade opressora, coloca seu turbante ou suas tranças, ela está reafirmando uma ancestralidade que sempre foi obrigada a reprimir. Isto significa que ao apropriar-se determinada cultura, embranquecendo seus atores, esvazia-se de todo o significado e seu caráter político. É o que ocorre repetidas vezes com a utilização dos turbantes e tranças, por exemplo, que são historicamente utilizados pelas culturas de matriz africana, mas, diariamente objetificados por diversos indivíduos na sociedade. Então Bia, apropriação cultural é sobre pessoas brancas usando turbantes ou tranças? Você poderia questionar. E eu lhe diria que não! E faria isso por compreender que, na verdade, é muito mais que isso. Corroborando com diversos estudiosos que se debruçam sobre essa temática, compreendo que apropriação cultural não é uma crítica sobre o indivíduo branco, mas sobre uma estrutura racista nociva que apaga e silencia os demais a partir do epistemicídio histórico e cultural.
Na apropriação cultural, existe uma hierarquia bem definida entre os dois povos, de modo que aquele que se apossa dos conhecimentos, símbolos e objetos não oferece uma devolutiva à altura do que recebe – não é uma troca recíproca, mas exploradora – assim como as relações se estabeleciam no processo de escravização. As consequências disso para o povo que sofre esse processo são a expropriação, o esvaziamento, o enfraquecimento, prejuízos num longo arco que vai desde o extremo simbólico do desrespeito, a desarticulação política por direitos.
Por essas e outras razões, precisamos aprofundar no reconhecimento dessa temática para construir uma sociedade minimamente pautada na equidade, não é? Me conta, quais as suas impressões acerca desse tema?!